Pouco
menos de vinte e um anos se passaram desde a criação da Lei Básica da
Previdência Social (Lei 8.213 de 24 de julho de 1991), que buscou, com notório
atraso, atender aos novos valores oriundos na Constituição Federal de 1988, com
ênfase na dignidade da pessoa humana. No entanto, lacunas e desencontros
predominam no ordenamento jurídico previdenciário, cabendo, por ora,
identificar as principais problemáticas a fim de incentivar debates voltados a
possíveis soluções, sendo esta a limitada proposta deste texto.
A
principal preocupação, apontada atualmente, volta-se ao equilíbrio (ou “desequilíbrio”) financeiro e atuarial da
Previdência Social, ou seja, gasta mais do que arrecada, questionando,
portanto, a sobrevivência do sistema.
Os
meios de comunicação, principalmente telejornais, frequentemente divulgam
estatísticas assombrosas referentes aos cofres da Previdência Social,
normalmente voltadas ao discurso que em um determinado período a Previdência
arrecadou tanto e gastou tanto a mais para pagar os benefícios concedidos,
tornando a palavra “déficit” a
conclusão habitual, causando descrença, insegurança e desconfiança em toda uma
legião de brasileiros que possuem as suas vidas intimamente ligadas à
Previdência Social.
De
igual forma, essas informações chegam de modo distorcido (ou “camuflado”) aos cidadãos, que, já
convictos da existência do “rombo” da
Previdência Social, desconhecem os dados da própria Dataprev, empresa pública
responsável pela administração das contas da Previdência, que trouxe um superávit de R$ 13,327 bilhões no ano de
2007, conforme os resultados contábeis do Fundo de Previdência e Assistência
Social - FPAS (Base de Dados
Históricos do Anuário Estatístico da Previdência
Social. Disponível em www3.dataprev.gov.br/infologo), sendo necessário, portanto, apreciar com ressalva as questionáveis afirmações de existência de débitos ou rombos nos cofres da Seguridade Social.
Social. Disponível em www3.dataprev.gov.br/infologo), sendo necessário, portanto, apreciar com ressalva as questionáveis afirmações de existência de débitos ou rombos nos cofres da Seguridade Social.
Dessa
forma, quando a reflexão se volta ao futuro da Previdência Social, inúmeras
questões devem ser pontualmente relevadas, quais sejam:
a) A população brasileira está vivendo
mais. O aumento significativo e crescente na expectativa
de sobrevida dos brasileiros é uma preocupação latente quando nos voltamos a
debater o destino da Previdência Social. Um estudo atuarial minucioso é
estritamente necessário hoje, mas o problema está no passado, quando a falta de
uma gestão qualificada dos recursos não pôde prever esta nova realidade.
b) Menos ativos e mais inativos.
O conceito de família se alterou radicalmente nos últimos anos, e a redução da
taxa de natalidade é uma realidade visível. Enquanto que nas gerações
anteriores era comum grupos familiares com 8 a 12 filhos, atualmente
dificilmente se fala em mais de dois. Isso acarretará uma desproporcionalidade
no número de ativos e inativos, ou seja, o número de pessoas que trabalham e
contribuem para o sistema irá diminuir e, em contrapartida, o número daqueles
que se beneficiam do mesmo tende a aumentar.
c) A informalidade nas relações de
trabalho. Notam-se os esforços depreendidos pelos governantes
nos últimos tempos voltados à formalização das relações de trabalho, no
entanto, a informalidade predomina em preocupantes proporções, conduzindo a um
cenário extremamente pessimista, onde se tem, de um lado, um número
considerável de trabalhadores desprotegidos e, do outro, a ausência da devidas
contribuições previdenciárias, tanto pela parte do empregado, como do
empregador, enfraquecendo a fonte de custeio.
Nesse sentido, discute-se, e muito, a
desoneração da folha de pagamento como um meio de incentivar o aumento do
mercado formal, já que, em virtude das altas alíquotas exigidas da parte
patronal, a informalidade se mostra como uma solução, enquanto que o “pagar por fora” se tornou uma conduta já
habitual.
d) Participação cada vez maior da
mulher no mercado de trabalho. O aumento gradativo e
constante do número de mulheres no mercado de trabalho, fenômeno que continuará
a crescer nos próximos anos, faz com que sejam repensados os tratamentos
desiguais conferidos aos homens e às mulheres. Atualmente, a mulher precisa de
30 anos de tempo de serviço para adquirir o direito à aposentadoria por tempo
de contribuição, enquanto que o homem necessita completar os 35 anos de labor,
diferença essa também existente nas aposentadorias por idade urbana, onde a
idade mínima para a mulher é 60 e para o homem é 65 anos de idade. Ainda se
justifica um tratamento diferenciado, dado, entre outros motivos, aos longos
anos de discriminação ao sexo feminino, que ainda insiste em perdurar, mesmo
que em proporções menores. Deveras, os questionamentos se voltam para reduzir
as diferenças de critérios para a concessão de aposentadoria entre os gêneros.
e) Aposentadorias precoces. O
fator previdenciário foi criado, votado e instituído em virtude de uma
tentativa frustrada do governo em implantar a idade mínima nas aposentadorias
por tempo de contribuição, limitação essa julgada inconstitucional pelo Supremo
Tribunal Federal. A fórmula do fator previdenciário leva em consideração a idade
da pessoa, expectativa de sobrevida e o tempo de contribuição, onde quanto
maior a idade, menor a expectativa de sobrevida e maior o tempo de contribuição
“melhor” será o fator previdenciário, ou seja, “menos gravoso”. É notório que o
objetivo do fator previdenciário foi incentivar a postergação das
aposentadorias por tempo de contribuição, uma vez que, quanto mais cedo o
brasileiro se aposenta, maior será a diminuição do fator previdenciário sobre o
valor da aposentadoria. Mas, essa redução salarial provocada pelo Fator
Previdenciário, inviabiliza que o aposentado do RGPS se afaste do mercado de
trabalho e, dessa forma, não abre oportunidades para trabalhadores mais novos
iniciarem a vida trabalhista e se tornarem contribuintes do RGPS. O tiro saiu
pela culatra. O objetivo não foi alcançado, eis que o brasileiro preferiu
continuar a se aposentar cedo a esperar ter um fator previdenciário melhor, até
porque, não raras vezes, é muito mais vantajoso para o segurado,
financeiramente falando, amargar uma perda financeira causada pelo fator a
esperar mais tempo para se aposentar, na esperança de obter um salário de
aposentadoria melhor.
De
igual forma, a criação do fator previdenciário propiciou uma significativa
economia para os cofres da Previdência, já que, em mais de 90% dos casos, atua
como um redutor da média contributiva.
Uma
ideia a ser discutida quando se busca minimizar as “aposentadorias precoces” é
a criação de mecanismos de incentivo à postergação da aposentadoria, como, por
exemplo, um abono de permanência para aqueles que optam em continuar
trabalhando para se aposentar mais tarde.
f) Qualidade de gestão. A
Previdência Social paga atualmente um preço muito alto pelos péssimos trabalhos
de gestão que existiram, principalmente em meio à década de 90, quando
pensamentos imediatistas e posturas reativas tomavam o lugar das ideias
estratégicas e condutas preventivas. Uma gestão profissional na administração
previdenciária é crucial para a manutenção do sistema, englobando aqui, também,
o aumento do número de servidores e a qualificação dos mesmos.
Quando
a atenção se volta ao futuro da Previdência Social, esses são os pontos que
devem ser relevados, analisados e debatidos.
Informações
sérias, precisas e despidas de “camuflagens”
são o que se necessita para que as mudanças práticas se tornem efetivas,
promovendo, gradativamente, uma restruturação no sistema previdenciário
nacional.
Políticos
desprovidos de conhecimentos técnicos previdenciários, detentores de discursos
vagos, projetos de leis utópicos e demagógicos, que nada mais buscam do que a conquista
de eleitores leigos, devem ser identificados e contidos, pois quanto mais entrarmos
no campo do imaginário, mais longe ficaremos da realidade e menores serão as
chances de mudança.
A
Previdência Social, nos próximos dez anos, deverá sofrer mudanças importantes,
esperemos que sejam salutares e prósperas, compatíveis com a arrecadação
previdenciária dos trabalhadores, que haja uma relação franca de prestação e
contra-prestação, ou seja, quando o segurado requisitar seus direitos frente às
suas contribuições arrecadadas pela Previdência Social, que esses direitos sejam
originariamente satisfeitos.
*Artigo publicado na revista Versa - Edição jan/fev 2012.
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Sobre o autor:
Advogado sócio da Accadrolli Advocacia
Previdenciária. Proprietário do site www.aposentadoriadoinss.com.br. Criador e
administrador do blog aposentadoriadoinss.blogspot.com. Especialista em
planejamento financeiro de aposentadoria. Presta serviço de assessoria jurídica
e administrativa especializada em questões de benefícios junto ao INSS. Criador
e apresentador do programa “Aposentadoria TV” (veiculado via web:
www.aposentadoriadoinss.com.br). Vice Presidente da Comissão Especial do Jovem
Advogado de Passo Fundo/RS. Palestrante do 1ª Work Shop sobre aposentadoria
especial da Região Norte do Rio Grande do Sul. Diversos artigos publicados.