!-- JavaScript Posts Resumidos-->

Páginas

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

ALGUNS APONTAMENTOS SOBRE O PROCESSO ADMINISTRATIVO PREVIDENCIÁRIO RELACIONADO AOS BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE.


 O trabalho é protegido pela ordem econômica (art. 170, da CF) e pela ordem social (art. 193, da CF). Em razão disso, imprescindível proteger o cidadão privado de ter garantido o seu sustento em razão do surgimento de qualquer tipo de incapacidade. A incapacidade deve ser vislumbrada a partir de sua relação com o trabalho, ou ainda, como também entendemos, pela abrangência ou gravidade da doença a ocasionar ao cidadão limitações em sua vida diária. Como bem lembra Ribeiro[1], a capacidade laborativa é uma questão de equilíbrio entre as exigências de uma dada ocupação e a condição de realizá-las, sendo crucial a análise do diagnóstico da doença (CID 10), tipo de atividade ou profissão desempenhada pelo segurado, os dispositivos legais pertinentes, além da viabilidade de futura reabilitação profissional. Importante esclarecer, ainda, a existência da “incapacidade social” formada pela jurisprudência pátria, no sentido entender que o grau de incapacidade deve ser analisado de acordo com a situação sócio-econômica e cultural do segurado, considerando o ambiente em que vive, sua idade, o tipo de limitação, sua capacitação profissional, além de seu grau de instrução.

Pertinente esclarecer que os benefícios por incapacidade devem seguir os ditames do princípio constitucional da universalidade da cobertura e do atendimento, nos termos do art. 194, I, da Carta Magna, e quanto ao mérito, pressupõem a existência de incapacidade para o trabalho ou atividade cotidiana, pois a Lei de Benefícios não estabelece distinções entre segurados empregados e contribuintes individuais.
De outra banda, o art. 18, da Lei 8.213/91 estabelece os tipos de prestações, quais sejam os benefícios de aposentadoria por invalidez, auxílio-doença e auxílio-acidente. 
Nesse viés, inicialmente, há o auxílio-doença então determinado no artigo 59, da Lei 8.213/91:

“Art. 59. Auxílio-doença será devido ao segurado que havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigida nesta lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos”.

Percebe-se que o texto da referida lei determina o direito ao benefício por aquele segurado incapacitado, temporariamente, para o trabalho ou para sua atividade habitual. Os primeiros 15 dias de doença do empregado são remunerados pelo empregador, ao passo que daí em diante o pagamento se dá pela Previdência Social (art. 60, da Lei 8.213/91), tendo em vista o obreiro ser considerado licenciado do trabalho (art. 63, da Lei 8.213/91). Percebe-se com isso, lembra Vianna[2], que o legislador previdenciário, considerando a capacidade contributiva dos empregadores, divide com a empresa a responsabilidade do pagamento dos dias de afastamento, arcando a autarquia federal sozinha apenas com os benefícios dos domésticos, trabalhadores avulsos, contribuintes individuais (autônomos e empresários) e contribuintes facultativos. Importa referir que os segurados com direito ao recebimento dos benefícios por incapacidade estão elencados no art. 11, da Lei 8.213/91. Desta forma, existem os segurados obrigatórios, em função do exercício da atividade remunerada realizada, seja por contrato de trabalho regido pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, seja pela prestação de serviços a terceiros de forma individual ou sob a forma societária, e ainda, para os trabalhadores avulsos e o segurado especial, não se excluindo do direito ao benefício o segurado facultativo, previsto pelo art. 13, da Lei 8.213/91.
Cabe lembrar que há, também, o Auxílio-Doença por Acidente de Trabalho, concedido na hipótese de o segurado, empregado ou especial, sofrer acidente do trabalho ou passar a ter doenças ocupacionais em razão do labor, conforme artigos 19, et.seq.,, da Lei 8.213/91. As diferenças em relação ao benefício por incapacidade comum estão no fato que de o auxílio-doença por acidente de trabalho dar direito ao segurado empregado estabilidade de 1 ano, ou mais, após o retorno às funções habituais na empresa, de acordo com convenção ou acordo coletivo. Além disso, o benefício acidentário condiciona ao empregador continuar recolhendo FGTS durante a fruição do benefício, conforme art. 15, parágrafo 5.º, Lei 8.036/90. Ademais, poderá o segurado comprovar o nexo causal e fazer prova perante a Justiça do Trabalho quanto à responsabilidade civil do empregador pelo acidente sofrido. Aliado a isso, o benefício acidentário pode gerar ao segurado que o usufruiu, direito a um novo benefício, qual seja o auxílio-acidente, uma espécie de indenização para o segurado que teve seqüelas do acidente sofrido que o impossibilite e retornar a mesma profissão, contudo o permitindo realizar função diversa, de acordo com art. 86, da Lei 8.213/91, c/c Anexo III do Decreto 3048/99.
No caso de afastamento superior a 6 meses, para os dois tipos de benefício, em se tratando de segurado empregado, assevera Carrion[3], a empresa empregadora não deve o 13 º salário proporcional ao período correspondente, mas a Previdência concede o abono anual.
Por fim, no que concerne às prestações previdenciárias em função da incapacidade laborativa, temos a aposentadoria por invalidez, que pressupõe a existência de incapacidade permanente e oniprofissional. Nesse sentido estabelece o art. 42, da Lei 8.213/91, in verbis:

Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á para enquanto permanecer nesta condição.

Desta forma, o segurado que for considerado permanentemente incapaz para realizar atividade profissional habitual, e não tiver condições de ser reabilitado em profissão diversa a garantir-lhe o sustento, ou ainda, em sendo segurado facultativo, for acometido de incapacidade acentuada a limitar suas atividades cotidianas, deverá ter concedida sua aposentadoria por invalidez. No caso do empregado, concedido o benefício, o contrato de trabalho estará automaticamente suspenso, de acordo com art. 475, da CLT, não existindo qualquer obrigação legal por parte do empregador. Todavia, existem alguns efeitos desta suspensão, como a persistência da relação empregatícia, o direito ao retorno em caso de encerramento ou solicitação por parte do segurado e a impossibilidade de extinção contratual por ato unilateral[4].
A polêmica se inicia com o procedimento administrativo adotado pelas agências de previdência social de todos país, para a análise da existência da incapacidade ao trabalho dos segurados e a forma com que os benefícios são mantidos.
O procedimento é iniciado a partir do momento em que o segurado entra com o chamado Requerimento de Benefício por Incapacidade, que ao ser protocolado na agência mais próxima ao local em que reside, de imediato é agendada data para a realização da perícia médica para a confirmação da existência da incapacidade ao trabalho. Importante frisar, que em algumas agências da previdência social no interior do país, chega-se a marcar perícia para mais de 30 dias do protocolo, ao contrário das grandes metrópoles, em que o agendamento de uma perícia pode levar vários meses.
Após a avaliação médico-pericial, é dado ao segurado uma Comunicação de Resultado de Decisão de perícia em que será, previamente, lhe dado prazo para encerramento de seu benefício, pela conhecida “alta-programada”, preceituada no Decreto n. 5.844 de 2006, procedimento extremamente precário e injusto.
Após a data de encerramento do benefício determinada pelo médico perito, persistindo a incapacidade laboral do segurado, é ônus deste, caso constate que ainda está incapaz, protocolar Pedido de Prorrogação de benefício (P.P.) até 15 (quinze) dias antes da data da cessação do benefício. Tal pedido nada mais é do que meio a realizar nova perícia a cargo do segurado. Realizada a nova perícia, e esta conclui pela inexistência da incapacidade laboral, pode o segurado protocolar o Pedido de Reconsideração (P.R.) de perícia no prazo de 30(trinta) dias contados do dia seguinte data da ciência da conclusão contrária, nos casos de perícia inicial, ou do dia seguinte a data de cessação do benefício, ressalvada a existência de pedido de prorrogação não atendido ou negado, hipótese em que o prazo será contado da ciência da decisão pericial desfavorável.
Oportuno referir que, antes, o segurado que tivesse seu pedido de prorrogação negado, ao marcar o pedido de reconsideração tinha encerrado seus pagamentos até a realização de nova perícia. Tal medida além de injusta atentava ao devido processo legal, (art. 5 º, LIV e LV, da CF/88), que também deve se respeitado no processo administrativo. Ou seja, como encerrar os pagamentos antes de findo o processo administrativo? Em razão disso, foi proposta a Ação Civil Pública n º 2005.33.00.020219-8. A sentença foi no sentido de determinar ao INSS que, no procedimento de concessão do benefício de auxílio-doença, inclusive aqueles decorrentes de acidente do trabalho, uma vez apresentado pelo segurado pedido de prorrogação, mantenha o pagamento do benefício até o julgamento do pedido após a realização de novo exame pericial.
Acatando a decisão judicial e para dar cumprimento a ela, o INSS emitiu e publicou no Diário Oficial da União, de 20/07/2010, a Resolução INSS/PRES 97, de 19 de julho de 2010, definindo assim os procedimentos para manutenção e pagamento do benefício de auxílio-doença enquanto não for realizado novo exame médico pericial.
Sendo assim, mesmo mantendo o procedimento da "alta programada" para cessar o auxílio-doença, caso o segurado solicite sua prorrogação e o INSS não consiga agendar a perícia para antes da data de cessação prevista, será mantido o pagamento do benefício até a efetivação da perícia.
Todavia, ainda permanece uma omissão grave nesta questão. Os pagamentos são mantidos a partir do protocolo do pedido de prorrogação do benefício, não acontecendo o mesmo com os pedidos de reconsideração. Ou seja, caso o segurado tenha seu pedido de prorrogação negado, irá receber até o dia da perícia que encerrou o benefício, mas, mesmo tendo direito a fazer o pedido de reconsideração, não receberá mais pagamentos. Como referido, não é admissível encerrar os pagamentos antes do término do processo administrativo, o que é uma lástima. De toda sorte, a manutenção dos pagamentos na espera da realização de perícia para os pedidos de prorrogação foi uma grande conquista.
Outra questão polêmica é o largo tempo de espera para a realização de perícia para os que pela primeira vez agendam o benefício. Para estes não há pagamentos enquanto esperam pela realização de perícias. Assim, um trabalhador se vê privado de seu salário por um ou vários meses a depender de cada agência de previdência no país.
Em razão disso, no dia 31/10/2011, a Justiça Federal do Rio Grande do Sul e o Instituto Nacional do Seguro Social fecharam um acordo para reduzir o tempo de espera no agendamento de perícias para a concessão inicial de benefícios. A decisão foi acertada no Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejuscon) de Porto Alegre e deve produzir efeitos em todo o Estado.
A Defensoria Pública da União (DPU) ajuizou a ação civil pública em junho deste ano após constatar que, em muitos municípios gaúchos, o prazo para agendamento de perícias era muito superior a 30 dias. Conforme documentos do processo, os casos mais críticos eram Porto Alegre, Novo Hamburgo e Canoas, onde o período entre a requisição e a realização do procedimento chegava a seis meses. Com o pré-acordo firmado hoje, o processo judicial  fica suspenso até o final de fevereiro de 2012.                 Desde junho, o Cejuscon da JF de Porto Alegre realizou três audiências de conciliação conduzidas pelo juiz federal Jurandi Borges Pinheiro. Na mais recente delas, ocorrida nesta segunda-feira, o INSS se comprometeu a adotar uma série de medidas para melhorar a situação. Ficou definida a implantação de um projeto-piloto no estado do novo modelo de perícia médica que está sendo desenvolvido pela autarquia. Com a nova sistemática, os pedidos de afastamento por motivo de doença de até 60 dias são dispensados da perícia médica, sendo concedidos automaticamente.
Além disso, entre as medidas definidas no pré-acordo, destacam-se a utilização de no mínimo 70% dos peritos médicos na realização de exames periciais e a realização de concurso público para contratação de mais profissionais nos primeiros meses de 2012, já autorizado pelo Ministério do Planejamento. A defensora pública federal Fernanda Hahn e os procuradores federais Sérgio Roberto Hall Brum de Barros e Milton Drumond Carvalho também participaram da reunião.
A autarquia também se dispôs a reduzir o tempo médio de espera para atendimento de perícia inicial nas gerências onde esse prazo é maior. A intenção é chegar a 55 dias na primeira quinzena de dezembro e 45 dias no final de fevereiro, com a apresentação de relatório atualizado para acompanhamento das metas em 15/12/2011 e 29/2/2012. 
         O fato é que muitas mudanças precisam ser feitas. Acredito que o aumento do número de médicos peritos, especialistas para cada área médica e medida imprescindível. Além disso, a manutenção dos pagamentos mesmo com pendência de pedido de reconsideração é obrigatória em respeito ao devido processo legal administrativo. Outro ponto importante é a vinculação obrigatória dos médicos assistentes para todo o tipo de esclarecimento e até o comparecimento para a realização de juntas médicas.
Enfim, muitas mudanças precisam ser realizadas com urgência. O judiciário, mais uma vez, está a exercer papel importante no respeito à dignidade humana, em vista da total omissão do legislador. Esperamos que ocorram mais mudanças.


[1] RIBEIRO, Juliana de Oliveira Xavier. Auxílio-Doença Acidentário. Curitiba: Juruá, 2008, p. 63.
[2] VIANNA, Cláudia Salles Vilela. A Relação de Emprego e os Impactos Decorrentes dos Benefícios Previdenciários. 2 ª ed. São Paulo: LTr, 2010, p. 29.
[3] CARRION, Valentim. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 35 ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 400.
[4] Discute-se na doutrina e jurisprudência se a suspensão contratual deve prevalecer indeterminadamente ou se é possível a resilição contratual após cinco anos de vigência da aposentadoria por invalidez. A discussão pauta-se no conflito existente entre o art. 475, da CLT e a Súmula n º 217, do STF. A referida súmula confere caráter definitivo ao benefício caso o mesmo perdurar por mais de 5 anos. Ou seja, por esse entendimento após os 5 anos da vigência do benefício poderia ocorrer a rescisão contratual. Todavia, na esteira dos ensinamentos de Carrion, “inexiste no direito positivo atual a aposentadoria definitiva por invalidez; a qualquer tempo, mesmo após 5 anos (prazo do direito anterior), pode ser cancelada, caso readquirida a capacidade laborativa” (In: CARRION, op, cit., p. 398). Desta forma, caracteriza-se a suspensão do contrato, mesmo após o 5 anos da aposentadoria, não existindo a possibilidade de rescisão unilateral do contrato de trabalho do obreiro aposentado por invalidez. No mesmo sentido, entende a jurisprudência: EMENTA: APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. PLANO DE SAÚDE. A aposentadoria por invalidez acarreta a suspensão do contrato de trabalho, conforme art. 475 da CLT, o que importa em sustação temporária dos seus principais efeitos em relação às partes (prestação de serviços e pagamento de salários), restando preservado, porém, o vínculo de emprego e remanescendo o dever de cumprimento daquelas obrigações não vinculadas diretamente à prestação de serviços, tal como a manutenção do plano de saúde, observadas as mesmas regras e critérios vigentes antes da supressão, inclusive quanto a quota de participação da empregada”. (TRT 4ª. Região – Processo n º 0000214-45.2010.5.04.0861 – Relator: Des. Alexandre Correia da Cruz – Data: 10.03.2011).

Autor:

 Sócio da Accadrolli Advocacia Previdenciária. Possui graduação em Direito pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões - URI Campus de Erechim (2002). Pós-graduação em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito da IMED/RS (2007). Pós-Graduação em Direito Previdenciário pela Universidade de Passo Fundo - UPF/RS (2010). Cursou a disciplina de Jurisdição Constitucional do Mestrado em Direito da Universidade de Santa Cruz do Sul, como aluno especial (2009). Advogado.
Mais sobre o autor. 





 
 
 
...